O cuidado da enfermeira à pessoa transexual, no processo transexualizador, na perspectiva familiar

Publication year: 2019

Introdução:

O desejo da reintegração familiar e a concepção biologicista e binária que a família possui em relação às pessoas transexuais foram as inquietações que impulsionaram o desenvolvimento da pesquisa. O objetivo geral do estudo foi analisar as estratégias de cuidado adotadas por enfermeiras com as pessoas transexuais na perspectiva familiar no processo transexualizador.

Método:

pesquisa qualitativa, descritiva, exploratória, utilizou o Método Narrativa de vida. As narrativas foram coletadas em três unidades de saúde cadastradas para o atendimento do processo transexualizador. As participantes do estudo foram 19 transexuais, 14 familiares e 03 enfermeiras que atendem às pessoas transexuais, no processo transexualizador. Para cada grupo de participantes, utilizaram-se diferentes questões norteadoras para as entrevistas narrativas, realizadas entre outubro de 2018 a abril de 2019, mediante a aceitação e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), aprovado pelo comitê de Ética sob o parecer nº 2797427. Realizou-se a análise compreensiva a partir do seguinte indício: o transexual é prisioneiro do seu corpo, da normatização social e das instituições.

Foram construídos três níveis de significação:

primeiramente a construção da personalidade das pessoas transexuais, a situação objetiva nas relações e conflitos entre as pessoas transexuais com a família, enfermagemsistema de saúde e sociedade e as relações intersubjetivas fortes com a família frente ao processo de transição e consequências estruturais e das pessoas transexuais e suas famílias com a enfermeira frente ao processo de transição e consequências no cuidado. As narrativas foram discutidas na perspectiva da Teoria da Transição e com um aporte filosófico que aborde as relações de saber-poder, sexualidade, territorialidade, controle social, disciplina e controle dos corpos.

Resultados e discussão:

os níveis de significação evidenciaram a dificuldade das pessoas transexuais em vivenciar a transição física por influência da família e outras estruturas sociais como o sistema de saúde. O processo de interdição e separação sociofamiliar é um fenômeno marcado pela falta de informação sobre a transexualidade e pela pregação insistente de um discurso normativo binário como verdade que exclui as pessoas transexuais. A enfermeira na atenção básica, enquanto membro do microssistema de saúde e do macrossistema social, é cisnormativa, grande entrave na acessibilidade às tecnologias em saúde para a transição física no processo transexualizador, e prejudica o cuidado as pessoas transexuais. As enfermeiras no processo transexualizador, possuem um olhar cuidadoso e respeitoso a pessoa transexual, todavia, com foco no cuidado da transição física e não na abordagem integral e adaptação das famílias.

Conclusão:

O cuidado às pessoas transexuais, na perspectiva da família, ainda é um grande desafio para a enfermeira, com interferentes multifatoriais. O sentimento de inadequação física se manifesta desde a infância, persiste e promove a busca pelos serviços de saúde para a transição física e, consequentemente, adequação do seu corpo a identidade de gênero. Esse processo, entretanto, ocorre para além da transição física, e causa sofrimento com a interferência da família que não sabe conduzir ou cuidar da pessoa transexual. A limitação do estudo está na ausência de entrevistas com familiares que não aceitaram a transição.

Introduction:

The desire for family reintegration and the biological and binary conception that the family has in relation to transgender people were the concerns that drove the development of research. The general objective of the study was to analyze the care strategies adopted by nurses with transgender people from a family perspective in the transsexualising process.

Method:

qualitative, descriptive, exploratory research, used the Narrative Method of life. The narratives were collected in three health units registered to meet the transsexualising process. The study participants were 19 transsexuals, 14 family members and 03 nurses who attend transgender people in the transsexualising process. For each group of participants, different guiding questions were used for the narrative interviews, conducted from October 2018 to April 2019, by accepting and signing the Informed Consent Form (ICF), approved by the Ethics Committee under Opinion No. 2797427.

A comprehensive analysis was conducted based on the following evidence:

the transsexual is a prisoner of his body, social norms and institutions.

Three levels of meaning were constructed:

firstly, the construction of the personality of transgender people, the objective situation in the relationships and conflicts between transgender people with the family, the nursing-health system and society, and the strong intersubjective relations with the family in the face of the process of transition and structural consequences of transgender people and their families with the nurse facing the transition process and consequences in care. The narratives were discussed from the perspective of Transition Theory and with a philosophical approach that addresses the relations of knowledge-power, sexuality, territoriality, social control, discipline and body control.

Results and discussion:

The levels of significance showed the difficulty of transgender people in experiencing the physical transition influenced by family and other social structures such as the health system. The process of interdiction and socio-family separation is a phenomenon marked by the lack of information about transsexuality and the insistent preaching of a binary normative discourse as truth that excludes transgender people. The primary care nurse, as a member of the health microsystem and the social macrosystem, is cisnormative, a major barrier to accessibility to health technologies for the physical transition in the transsexualising process, and undermines care for transgender people. The nurses in the transsexualising process have a careful and respectful look at the transgender person, however, focusing on the care of the physical transition and not on the integral approach and adaptation of families.

Conclusion:

Caring for transgender people from a family perspective is still a major challenge for nurses with multifactorial interferences. The feeling of physical inadequacy manifests itself since childhood, persists and promotes the search for health services for the physical transition and, consequently, the adaptation of your body to gender identity. This process, however, occurs beyond the physical transition, and causes suffering with interference from the family who cannot drive or care for the transgender person. The limitation of the study is the absence of interviews with family members who did not accept the transition.