Publication year: 2019
Introdução:
Os eventos adversos são responsáveis por um grande número de complicações, invalidez e morte em pacientes cirúrgicos. Estima-se que, anualmente, ocorram sete milhões de complicações em pacientes cirúrgicos e cerca de um milhão de mortes durante ou imediatamente após a cirurgia. Assim, a fim de minimizar a sua ocorrência, em 2008, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou o desafio global “Cirurgias Seguras Salvam Vidas”, visando promover a melhoria da qualidade do cuidado prestado a esses pacientes. O desafio propõe a aplicação de um checklist cirúrgico que contribui para despertar a equipe multiprofissional para ações simples, porém fundamentais dentro da complexidade do procedimento cirúrgico. Diante da proposta de implementação do checklist na melhoria da segurança do paciente cirúrgico, o presente estudo teve como questão norteadora: Qual é o impacto do checklist cirúrgico nas infecções do sítio cirúrgico (ISC), reinternação, reoperação e mortalidade no período de 30 dias em duas instituições de realidades distintas: Brasil e Canadá? Objetivo: Analisar o impacto da adoção do checklist cirúrgico nas infecções do sítio cirúrgico, reinternação, reoperação e mortalidade em cirurgias colorretais de duas instituições de realidades distintas: Brasil e Canadá. Métodos:
Tratou-se de um estudo retrospectivo realizado em um hospital de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil e um hospital em Ottawa, Ontário, Canadá, ambos de grande porte, públicos e universitários. Este estudo respeitou a Resolução 466 de 2012 do Conselho Nacional de Saúde e foi parte de um projeto maior, tendo sido submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa no Brasil (037048/2017) e Canadá (REB # 20170449-01H). A coleta de dados foi feita por meio da revisão de prontuários acerca do preenchimento do checklist e registros de complicações como retorno não planejado à sala de cirurgia, reinternação, ISC e mortalidade até o trigésimo dia no pós-operatório de cirurgias colorretais, no período de janeiro de 2015 a julho 2017, em ambas as instituições hospitalares. Para avaliação do impacto da implementação do checklist cirúrgico foram também analisados os mesmos dados de pacientes no ano anterior à implementação do checklist, sendo estes pareados por sexo, idade, classificação ASA (American Society of Anesthesiologists), potencial de contaminação da ferida operatória, tipo de cirurgia (eletiva ou urgência) e tempo de duração. Os resultados foram avaliados por instituição e comparados entre si. Os dados foram analisados estatisticamente no programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) para Windows (versão 21.0), onde foram realizadas medidas de tendência central e dispersão; análise inferencial, teste paramétrico, Qui-Quadrado ou Exato de Fisher, para variáveis categóricas e t Student simples ou Mann-Whitney, para as variáveis numéricas contínuas. Resultados:
Foram incluídos 518 prontuários no Brasil, sendo 171 (33%) no período anterior à implementação do checklist cirúrgico e 347 (67%) posterior à sua implementação; e 842 prontuários no Canadá, dos quais 177 (21%) corresponderam ao período anterior à implementação do checklist cirúrgico e 665 (79%) posterior a sua implementação. No que se refere à completude do checklist no Brasil, dos 347 checklists, 222 (64%) estavam completos e 125 (36%) incompletos. No Canadá, dos 665 prontuários avaliados com a presença do checklist, observou-se que 657 (98,8%) estavam completos e 8 (1,2%) incompletos. Quanto aos desfechos, no hospital do Brasil a taxa de ISC reduziu após a implementação do checklist de 17% para 14,4%, o número de reinternação também teve uma queda de 2,9% para 1,7%, enquanto o quantitativo de reoperações aumentou de 5,3% para 8,1% e os óbitos de 1,8% para 3,5%. No hospital canadense a taxa de ISC reduziu após a implementação do checklist de 27,7% para 25,9%, a reinternação aumentou de 6,8% para 8,1%, a reoperação reduziu de 5,6% para 4,8% e os óbitos de 1,7% para 0,9%. Mas em nenhuma das realidades esses desfechos foram estatisticamente significativos. Observou-se uma relação direta entre o aumento da incompletude do checklist e desenvolvimento de ISC
no Brasil (p = 0,026). Conclusão:
O presente estudo verificou que embora o checklist seja adotado com adaptações em diferentes cenários, a sua implementação não foi capaz de reduzir complicações e mortalidade cirúrgicas em cirurgias colorretais nas distintas realidades estudadas, conforme evidenciado pela OMS. Contudo, a associação significativa entre aumento de checklists incompletos e o desenvolvimento de ISC no Brasil e a ausência dessa relação no Canadá, permite inferir que o impacto do checklist pode ser maior em países em desenvolvimento, onde políticas para a segurança do paciente são frágeis e as estratégias multimodais de prevenção e controle de ISC são escassas, divergindo da realidade de países desenvolvidos. Entretanto, ainda é passível de questionamento se o potencial impacto dessa ferramenta nesses cenários seria permanente ou pontual, uma vez que apenas o checklist, sem o auxílio de outras medidas, pode não ter um efeito sustentado em longo prazo.(AU)
Introduction:
Adverse events are responsible for a huge number of complications, disability, and death in surgical patients. It is estimated that, annually, happens seven million complications and that around one million dies during or immediately after surgery. In this sense, in order to minimize its occurrence, in 2008, the World Health Organization (WHO) launched a global challenge “Safe Surgery Saves Lives”, aiming to improve quality of care given to these patients. The challenge proposed an application of a surgical checklist that contributes to awakening the multiprofessional team to simple actions, but essentials considering the complexity of the surgical procedure. Considering the proposal of checklist implementation in patient safety improvement, this study had the following guiding questions: What is the impact of adoption of surgical checklist on Surgical Site Infection (SSI), readmission, reoperation, and mortality in 30 days follow up in two facilities from different settings: Brazil and Canada? Aim: To analyze the impact of adoption of surgical safety checklist on the occurrence of SSI, readmission, reoperation, and mortality in colorectal surgeries of two institutions of different settings: Brazil and Canada. Methods:
A retrospective study was conducted in one hospital in Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil and one hospital in Ottawa, Ontario, Canada, both large, public, and university hospitals. This study respected 466 Resolution 2012 of Brazilian National Health Council and it was part of a broader project, which was approved by the Brazilian Research Ethics Board (037048/2017) and Canadian Research Ethics Board (#20170449-01H). Data collection was done through chart review where checklist completion and complications as an unplanned return to the operating room, readmission, SSI and mortality up to thirtieth day in postoperative colorectal procedures were analyzed, from January 2015 to July 2017 in both institutions. To evaluate the impact of surgical checklist implementation also was analyzed the same data from patients in the year before checklists implementation, being these matched by sex, age, ASA (American Society of Anesthesiologists) score, wound classification, type of surgery (elective or urgency), and duration of operation. The results were evaluated by institution and compared between them. Data was statistically analyzed in the Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) for Windows (version 21.0) where it was carried out measures of central tendency and dispersion; inferential analysis, nonparametric test, chi-square or Fisher exact test, for categorical variables, simple t Student or Mann-Whitney test, for continuous variables. Results:
A total of 518 medical records were included in Brazil, of which 171 (33%) were in the period before the implementation of the surgical checklist and 347 (67%) after the implementation of the checklist; and 842 medical records in Canada, of which 177 (21%) corresponded to the period before the implementation of the surgical checklist and 665 (79%) after the implementation of the checklist. Regarding the completion of the checklist in Brazil, 222 (64%) were complete and 125 (36%) were incomplete. In Canada, of the 665 records evaluated with the presence of the checklist, it was observed that 657 (98.8%) were complete and 8 (1.2%) were incomplete. Regarding the outcomes, in Brazilian hospital the SSI rate decreased after the implementation of the checklist from 17% to 14.4%, and readmission also fell from 2.9% to 1.7%, the number of reoperations increased from 5.3 % to 8.1%, and deaths from 1.8% to 3.5%. In Canadian hospital the SSI rate reduced after the implementation of the checklist from 27.7% to 25.9%, readmission increased from 6.8% to 8.1%, reoperation decreased from 5.6% to 4.8%, and deaths from 1.7% to 0.9%. But in no setting the outcomes were statistically significant. It was observed a direct association between a high number of incomplete checklists and development of SSI in Brazil (p = 0.026). Conclusion:
The present study verified that although the checklist has been adopted with adaptations in different scenarios, its implementation was not able to reduce surgical
complications and mortality in colorectal surgeries in the distinct settings studied, as evidenced by the WHO. However, the significant association between the increase in incomplete checklists and the development of SSI in Brazil and the absence of such relationship in Canada suggests that the impact of the checklist may be greater in developing countries, where patient safety policies are fragile and multimodal strategies for SSI control and prevention are scarce, diverging from the reality of developed countries. However, it is still questionable whether the potential impact of this tool on these scenarios would be permanent or punctual, since the checklist only, without the aid of other measures, may not have a sustained long-term effect.(AU)