Corpos negados na violência conjugal
Publication year: 2013
A violência conjugal contra a mulher é um problema de saúde pública que afeta a multidimensionalidade feminina. Trata-se de pesquisa qualitativa com abordagem fenomenológica, desenvolvida na Delegacia da Mulher em Guarapuava, Paraná, e que teve como objetivo: compreender o significado de coexistir com o agressor após a denúncia da violência conjugal na Delegacia da Mulher. Entre março e agosto de 2012 foram entrevistadas 14 mulheres, vítimas de violência conjugal, que permaneceram no convívio com o agressor após denunciá-lo. Os discursos foram interpretados à luz do referencial filosófico de Maurice Merleau-Ponty, dos quais emergiram dois temas: Corporeidades antagônicas, e Fragmentos de corporeidades femininas vítimas de violência conjugal. Assim, percebeu-se que trata-se de um fenômeno existencial no qual o conflito está presente cotidianamente, e pela ausência de diálogo gera desarmonia e instabilidade no relacionamento do casal, o que não possibilita a construção de uma relação quiasmática, de complementaridade, porquanto ambos são corporeidades antagônicas que não se percebem, não se sentem e nem se tocam harmonicamente. Independentemente da denúncia, o agressor não demonstrou uma postura de abertura para deixar-se perceber e sentir, a fim de possibilitar um movimento de aproximação que permitisse o encontro, o diálogo, e a resolução dos conflitos sem violência. O uso do álcool pelo companheiro contribuiu para precipitar a violência, modificou o ser e estar no mundo, afetou a relação do casal, de modo a colocá-los em um movimento existencial de afastamento e aproximação nos momentos de conflitos e agressões, que se manifestavam pela violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral, expressas por tapas, chutes, empurrões, tentativas de estrangulamento, cárcere privado, ameaças de morte, xingamentos, e relações sexuais forçadas. A partir do vivido, os corpos femininos incorporaram a linguagem degradante e pejorativa expressa pelos agressores, e diante do espelho, perceberam a existência de uma imagem corporal distorcida e negativa, que culminou na diminuição da autoestima, lhes causou dor, sofrimento e angústia. O vivido deixou marcas visíveis e invisíveis nos corpos femininos, que aos poucos adoeceram, e isso mostra que necessitam de um cuidado sensível. Destarte, a Enfermeira, enquanto corpo cuidador, deve adotar uma postura diferenciada diante desses corpos mediante um olhar atentivo, uma postura de abertura, aproximação e acolhimento, que possibilite a expressão das necessidades, angústias, medos, dúvidas, enfim, que permita a expressão do outro na sua totalidade, a fim de que possa perceber a face que não se mostra. A Enfermeira deve ter um olhar hermenêutico, capaz de interpretar, captar o invisível no visível, a fim de identificar as necessidades dos corpos femininos, que guiarão o planejamento e a implementação de ações voltadas para um cuidado sensível.
This research addresses domestic violence against women, a public health problem that affects the female multidimensionality. This is a qualitative study with a phenomenological approach developed in the Women's Police Station in Guarapuava, Paraná, and aimed to: understand the meaning of coexisting with the offender after the presentment of marital violence in the Women's Police Station. From March to August 2012 14 women were interviewed, victims of domestic violence, which remained in contact with the offender after reporting it. The speeches were interpreted under the light of the philosophy of Maurice Merleau-Ponty, and two themes emerged: antagonistic corporealities, and Fragments of female corporeality victims of domestic violence. Thus, we realized that this is a complex existential phenomenon, in which the conflict is present in a daily basis, and the absence of dialogue creates disharmony and instability in the couple's relationship, which does not allow the construction of a chiasmatic relation of complementarity, because both are antagonistic corporealities that do not understand, do not feel and do not touch each other harmonically. Regardless of the complaint, the offender has not demonstrated an attitude of openness to let himself feel and sense in order to facilitate a movement towards allowing the encounter, dialogue and conflict resolution without violence. Alcohol use by the partner contributed to precipitate violence, changed the being in the world, has affected the couple's relationship, so as to put them in an existential movement of separating and drewing in times of conflict and violence, which manifested by physical, psychological, sexual, patrimonial and moral violence expressed by slapping, shoving, attempted strangulation, false imprisonment, death threats, curses, and forced sex. From the experienced, female bodies incorporated the degrading and derogatory language expressed by the attackers, and in the mirror, realized the existence of a distorted and negative body image, which resulted in decreased self-esteem, caused them pain, suffering and anguish. The experienced left visible and invisible traces in female bodies, which gradually became ill, and this causes the need of sensitive care. Thus, the nurse, as caregiver body, must adopt a different position towards these bodies, through an attentive look, an attitude of openness, and welcome approach, which allows the expression of the needs, anxieties, fears, doubts, finally allowing expression of others in their entirety in order to perceive that face which is not shown. The nurse, should take an hermeneutic look able to interpret, capture the invisible in the visible, in order to identify the needs of the female bodies, which will guide the planning and implementation of actions for sensitive care.