Aborto provocado no contexto da violência doméstica: o discurso das mulheres
Abortion in the context of domestic violence: the speech of women

Publication year: 2009

Aborto provocado e violência doméstica são considerados problemas de saúde pública pela magnitude de conseqüências que afetam à saúde física e mental das mulheres. Não é uma prática recente e a depender da cultura adquire representações sociais diferentes, sendo alvo de discussões na atualidade. O objetivo geral deste estudo foi analisar o discurso das mulheres que vivenciaram o aborto provocado no contexto da violência doméstica. Pesquisa descritiva com abordagem qualitativa realizada numa maternidade pública do município de Salvador, Bahia, com 17 mulheres internadas por aborto provocado. A coleta de dados foi por entrevista semi-estruturada, com auxílio de gravador, feita entre julho a setembro de 2008. A organização e análise do material foram feitas pela estratégia metodológica do discurso do sujeito coletivo de Lefévre, que busca a fala da coletividade, a partir da identificação de idéias centrais sínteses e expressões-chave contidas nos discursos individuais das mulheres. A análise fundamentou-se em estudos de gênero, direitos reprodutivos, aborto provocado, violência doméstica e políticas públicas.

Resultados:

as mulheres se caracterizam como adolescentes e adultas jovens, baixa escolaridade, autodeclaradas negras e pardas; solteiras, morando com familiares, dependentes financeiramente de pai e mãe, desempregadas, desenvolvendo atividades autônomas de baixo retorno financeiro, outras sustentadas pelo companheiro. A maioria já tivera três filhos ou mais, utilizaram o Cytotec como método abortivo e justificam o aborto provocado, pela falta de emprego, ou baixa renda para sustentar uma criança; abandono, instabilidade financeira e violência doméstica por parte do companheiro e de familiares. Apresentam sentimento de culpa, vergonha e arrependimento, temem os julgamentos da família e da sociedade, já que o aborto representa um estigma social caracterizado como pecado e crime. Concluímos que as mulheres que abortam, precisam de espaço para acolhimento, escuta e resolução de suas demandas pelos serviços de saúde, no que se refere aos aspectos subjetivos e biológicos; o Estado precisa garantir os direitos reprodutivos das mulheres e a sociedade discutir e aprovar a descriminalização do aborto pensando no contexto destas mulheres. Mesmo com o reconhecimento das políticas públicas de saúde acerca da humanização do atendimento nos casos de aborto provocado, existe um distanciamento da efetivação desta prática por parte dos profissionais de saúde. A Enfermagem, caracterizada pelo cuidado, deve passar por processo de capacitação para o entendimento do contexto social das mulheres que abortam no sentido de reformular suas práticas; além disso, fomentar o debate sobre esta realidade nos currículos de formação.(AU)