Circunstâncias da ocorrência da gravidez não planejada em mulheres adultas

Publication year: 2011

A gravidez é marcada por mudanças físicas e psicossociais que define novos papéis para a mulher, podendo ser fruto de livre escolha reprodutiva ou ser referida como não planejada. Ações buscando garantir o direito das mulheres a decidir livremente sobre os padrões de reprodução estão implantadas na rede pública de saúde, entretanto um número significativo de mulheres refere vivenciar gravidez não planejada. O PSF se apresenta como possibilidade de dar respostas mais efetivas às demandas das mulheres, pois foi erguido sob princípios que valorizam as especificidades de cada grupo populacional no âmbito da atenção básica. O estudo teve como objetivo conhecer o contexto de vida de mulheres, usuárias do PSF, por ocasião da ocorrência de gravidez não planejada e analisar as circunstâncias de sua ocorrência. A pesquisa foi desenvolvida sob abordagem qualitativa e enfoque teórico de gênero. O universo empírico do estudo foi constituído por dez mulheres, cadastradas em duas Unidades de Saúde da Família localizadas no Distrito Sanitário do Subúrbio Ferroviário de Salvador-Ba, sendo o material empírico produzido por meio de entrevistas estruturadas e semi-estruturadas. Os depoimentos das participantes do estudo foram analisados pela técnica de análise de discurso. O discurso expressa uma posição social, cujas representações ideológicas são materializadas na linguagem e sua análise revela a visão de mundo dos sujeitos, sendo essa determinada socialmente. Os resultados mostraram que a maternidade é concebida como importante elemento identitário por todas as mulheres do estudo. Nas que estavam vivenciando a primeira gravidez, em relações estáveis, houve desejo do casal e descuidos que resultaram em gravidez, confirmando-se ambivalência, com aceitação imediata e sentimento de realização feminina. Para mulheres com gravidez subsequente, com desejo de ser mãe concretizado, as circunstâncias da ocorrência fizeram emergir sentimentos contraditórios e se estabeleceu o conflito entre aceitação e rejeição, havendo situações de desejo ou tentativas de abortamento. Quanto ao parceiro, foi constatada a não assunção de responsabilidade com a contracepção, tendo seu apoio importante papel no desfecho da gravidez. As dificuldades das mulheres em compartilhar a responsabilidade com seus parceiros, na gestão cotidiana da contracepção, somaram-se à informações fragmentadas e dificuldades de acesso aos métodos com descontinuidade e/ou limitação na oferta; incompatibilidade entre horários do trabalho com o do serviço de saúde; desejo do parceiro e da própria mulher ancorado nas construções identitárias. Desse modo, a gravidez ocorreu com inexistência da decisão consciente da mulher ou do casal, sendo a ambivalência um forte componente do processo. Uma vez tais situações ocorrendo em área de cobertura do PSF, afirmamos que este se encontra comprometido em seus fundamentos e urge rever a organização das práticas e a vontade política em todos os níveis da gestão para abrir caminhos à autonomia e à liberdade feminina, negadas pelos resultados deste estudo. (AU)