Mulher drogadita assistida no serviço especializado: interface entre gênero e integralidade da assistência em saúde

Publication year: 2014

O estudo objetivou analisar a assistência prestada à mulher dependente química no serviço especializado na perspectiva de gênero e integralidade da assistência. Defende-se a seguinte tese: gênero repercute na acessibilidade da mulher ao tratamento da dependência química interferindo no principio da integralidade da assistência. Trata-se de uma pesquisa clínico-qualitativa realizada no CAPSad, pertencente à Secretaria Executiva Regional III do município de Fortaleza – CE. Participaram da pesquisa dezessete mulheres que realizavam tratamento para o abusivo de drogas. O número de participantes foi definido intencionalmente, conforme critério de satisfação dos dados. A produção dos dados transcorreu durante cinco meses – de julho a novembro de 2013 - por meio de observação estruturada e não participante da dinâmica do serviço, entrevista estruturada e semidirigida, e grupo operativo. Seguiu-se o modelo de tratamento e apresentação dos dados indicados por Turato para pesquisa clínico-qualitativa, a saber: preparação inicial do material; pré-análise; elaboração de categorias e subcategorias temáticas alusivas à interseção das perspectivas da integralidade e gênero no cuidado à saúde das mulheres.

Para proceder à interpretação dos achados à luz da perspectiva da integralidade foram utilizados os seguintes constructos conceituais:

conceito ampliado de saúde, regionalização e hierarquização, insumos, recursos humanos e financeiros em saúde, interdisciplinaridade, recursos terapêuticos, gestão com participação da população e dos trabalhadores, acessibilidade, acolhimento, intersetorialidade, supervisão clínica e adscrição da clientela. Para interpretação dos achados sob a ótica de gênero, adotou-se a compreensão de autores como Scott e Butler que consideram o impacto desta categoria nos modos de viver o corpo e a repercussão no processo saúde-doença. Assim sendo, entende-se por gênero as diferenças sociais e culturais entre homens e mulheres e o modo como se produzem essas diferenças como desigualdades de poder. A apresentação final dos resultados foi elaborada de forma descritiva, com citações ilustrativas de recortes dos discursos registrados na entrevista e exposição de imagens das produções artísticas elaboradas no grupo operativo. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará – UFC. Os resultados evidenciam que a assistência ofertada, ainda, é fortemente marcada pelo paradigma biomédico e os recursos terapêuticos ofertados no serviço restringiam-se a: atendimento individual (prescrição de medicamentos); atendimento em grupo (grupos terapêuticos, oficinas terapêuticas e expressivas) e atendimento para a família. Os profissionais centralizavam suas atividades no serviço; não realizavam atividades comunitárias, reuniões de equipe, assembleias, visitas domiciliárias; não desenvolviam atividades interdisciplinares e intersetoriais. As mulheres apresentavam dificuldades relacionadas a gênero no acesso aos serviços de saúde, e na realização do tratamento para a dependência química, em virtude, principalmente, da vulnerabilidade social e peculiaridades clínicas. Constatou-se que a atenção recebida pelas mulheres dependentes químicas na perspectiva do princípio da integralidade do SUS e dos preceitos da Reforma Psiquiátrica mostrou-se como uma realidade distante da observada e apreendida neste estudo.(AU)