Segregação econômica em um grande centro urbano: disparidades no consumo e no ambiente alimentar

Publication year: 2019

NTRODUÇÃO:

A segregação econômica residencial e a consequente distribuição desigual de estabelecimentos que comercializam alimentos in natura e minimamente processados ou ultraprocessados pode ser um dos fatores determinantes das disparidades no consumo e segurança alimentar e nutricional da população. Entretanto, os estudos sobre a repercussão da segregação econômica residencial sobre o consumo e o ambiente alimentar limitam-se a países de elevada renda, menos desiguais e com características culturais e padrões alimentares diferentes do Brasil.

OBJETIVOS:

Examinar a associação entre segregação econômica residencial e o consumo alimentar de residentes no entorno de unidades do Programa Academia da Saúde de Belo Horizonte-MG e avaliar a associação entre a segregação econômica e o ambiente alimentar na cidade.

MÉTODOS:

Este trabalho será apresentado em dois artigos. O Artigo 1, de delineamento transversal, o objetivo foi calcular e descrever a segregação econômica residencial em Belo Horizonte-MG e verificar sua associação com marcadores de consumo alimentar saudável e não saudável entre participantes do Move-se Academias (2014-2015). Já no Artigo 2, um estudo ecológico, o objetivo foi analisar a distribuição de diferentes tipos de estabelecimentos que comercializam alimentos segundo a segregação econômica residencial. A segregação econômica residencial, categorizada em baixa, média e alta, foi calculada para cada setor censitário amostrado usando estatística Getis-Ord Local Gi* a partir da proporção de pessoas responsáveis pelos domicílios com rendimento mensal de até três salários mínimos. Para o Artigo 1, foram investigados homens e mulheres, não usuários do Programa, com idade ≥18 anos e participantes do estudo Move-se Academias.

Os marcadores de consumo alimentar avaliados foram:

consumo regular de frutas, hortaliças, feijão, peixe, carne com excesso de gordura, refrigerantes e doces; e substituição do almoço ou jantar por lanches. A distribuição das características do consumo alimentar por categoria de segregação foi examinada a partir da média e análise dos intervalos de 95% de confiança. Por conseguinte, análises de regressão logística binária, por meio do método Generalized Estimating Equations (GEE) foram aplicadas para examinar a associação entre segregação e os desfechos estudados. No Artigo 2, os estabelecimentos que comercializam alimentos foram classificados em: (1) predomínio de aquisição de alimentos in natura; (2) predomínio de aquisição de alimentos ultraprocessados e (3) mistos.

O número de estabelecimentos foi categorizado em:

nenhum; um; dois; três ou mais estabelecimentos e examinados por categoria de segregação econômica. Modelos de regressão ordinal de odds parcial proporcionais foram aplicados para analisar a associação entre a proporção de estabelecimentos e a segregação econômica residencial. Para ambos os estudos foi adotado um nível de significância de 5%.

RESULTADOS:

Analisou-se 3.833 setores censitários de Belo Horizonte-MG, 178 deles amostrados no estudo Move-se Academias. Os escores de segregação econômica residencial no município variaram de -6,64 a 3,92. Da amostra total, 18,9% eram áreas de alta segregação, 41,1% média e 40,0% baixa. No artigo 1, verificou-se que dos 1.301 participantes do Move-se Academias investigados, 361 (18,5%) viviam em áreas de alta segregação. Associações entre a alta segregação e o consumo regular de hortaliças (OR: 0,58; IC95%: 0,36-0,94) e feijão (OR: 2,01; IC95%: 1,17-3,49) foram significativas após ajustes. No artigo 2, verificou-se que áreas de alta segregação apresentavam 54,0% e 61,0% menos chance de possuírem elevada prevalência de estabelecimentos mistos e de aquisição de alimentos ultraprocessados, respectivamente quando comparadas a áreas mais afluentes (p<0,001).

CONCLUSÃO:

A segregação econômica residencial se associou ao consumo de alimentos marcadores de uma alimentação saudável e ao ambiente alimentar. Áreas altamente segregadas apresentam maior prevalência de consumo regular de feijão, menor prevalência de consumo regular de hortaliças, e menor chance de serem áreas com elevada proporção de estabelecimentos mistos e de aquisição predominante de alimentos ultraprocessados quando comparadas a áreas mais afluentes. Tais resultados denotam que tanto as áreas de alta segregação econômica quanto aquelas de baixa segregação devem ser alvo de políticas públicas e intervenções nutricionais que visem à promoção da alimentação adequada e saudável, seja para reduzir as desigualdades de acesso a alimentos saudáveis ou para proteger os territórios da ampla oferta de alimentos pouco saudáveis.

INTRODUCTION:

Residential economic segregation and the consequent unequal distribution of establishments that market fresh and minimally processed or ultra-processed foods may be one of the determining factors of consumer disparities and food and nutrition security of the population. However, studies on the repercussion of residential economic segregation on food consumption and the distribution of food-selling establishments are limited to high-income, less unequal countries with different cultural characteristics and food patterns from Brazil.

OBJECTIVES:

To examine the association between residential economic segregation and food consumption of residents around units of the Belo Horizonte-MG Academy of Health Program and to evaluate the association between economic segregation and the food environment in the City.

METHODS:

This work will be presented in two articles. Article 1, which was cross-designed, aimed to calculate and describe residential economic segregation in Belo Horizonte-MG and verify its association with markers of healthy and unhealthy food consumption among participants of Move-se academies. Article 2, an ecological study, aimed to analyze the distribution of different types of establishments that market food according to residential economic segregation. Residential economic segregation, categorized as low, medium and high, was calculated for each census tract sampled using Getis-Ord Local Gi* statistics from the proportion of people responsible for households with monthly income of up to three minimum wages. For Article 1, men and women, not users of the Program, aged ≥18 years and participants of the Move–se Academies (2014-2015) study were investigated.

The markers of food consumption evaluated were:

regular consumption of fruits, vegetables, beans, fish, meat with excess fat, soft drinks and sweets; and replacement of lunch or dinner with snacks. The distribution of food intake characteristics by segregation category was examined from the mean and analysis of the 95% confidence intervals. The binary logistic regression analyses, using the Generalized Estimating Equations (GEE) method were applied to examine the association between segregation and outcomes. In Article 2, establishments selling food were classified as: (1) predominance of the acquisition of fresh food; (2) predominance of acquisition of ultra-processed and (3) mixed.

The number of establishments was categorized into:

none; one; two; three or more establishments and examined by category of economic segregation. The partial proportional odds regression models were applied to analyze the association between the proportion of establishments and residential economic segregation. For both studies, a significance level of 5% was adopted.

RESULTS:

We analyzed 3,833 census tracts of Belo Horizonte-MG, 178 of them sampled in the Move-se Academies study. The scores of residential economic segregation in the municipality ranged from -6.64 to 3.92. Of the total sample, 18.9% were areas of high segregation, 41.1% average and 40.0% low. Article 1 found that of the 1,301 participants of the Move-se Academies investigated, 361 (18.5%) lived in areas of high segregation. Associations between high segregation and regular consumption of vegetables (OR: 0.58; CI95%: 0.36-0.94) and beans (OR: 2.01; 95% CI: 1.17-3.49) were significant. In Article 2, it was found that areas of high segregation were 54.0% and 61.0% less likely to have a high prevalence of mixed establishments and acquisition of ultra-processed foods respectively when compared to more affluent areas (p<0.001).

CONCLUSION:

Residential economic segregation has been associated with consumption of food markers of healthy eating and with the food environment. Highly segregated areas have a higher prevalence of regular bean consumption, lower prevalence of regular vegetable consumption, and lower chance of being areas with a high proportion of mixed establishments and food acquisition compared to more affluent areas. These results denote that both areas of high economic segregation and those of low segregation should be the target of public policies and nutritional interventions aimed at promoting adequate and healthy eating, or to reduce inequalities access to healthy foods or to protect territories from the wide range of unhealthy foods