A reforma psiquiátrica e as associações de familiares: unidade e oposição
The psychiatric reform and the family associations: unit and opposition
Publication year: 2002
Este estudo tem como objetivos conhecer a história de Associações de familiares dos serviços de saúde mental, compreendendo o que motiva as famílias a participarem de uma determinada associação; identificar as concepções do familiar sobre o processo de cuidar; conhecer os determinantes que levam os familiares a cuidar do doente mental ou delegar a outrem e contribuir para a formulação de diretrizes que orientem a atenção à família nos serviços de saúde mental. Está fundamentado no referencial teórico-metodológico do materialismo histórico dialético, pois o mesmo apresenta adequação à análise da realidade social, a partir de uma determinada visão de mundo dos sujeitos sociais envolvidos, considerando a historicidade dos fenômenos e permitindo, portanto, (re) olharmos a organização dos familiares nas Associações de familiares dos serviços de saúde mental. Foram estabelecidas, como balizas para o conhecimento do objeto, as categorias analíticas, ideologia e família. Para a construção das categorias empíricas foi utilizada a técnica de análise de discursos, a partir da depreensão dos temas contidos nos discursos dos entrevistados. Os cenários utilizados para o estudo foram a Associação Franco Basaglia (SP), que se posiciona favoravelmente às propostas preconizadas pela reforma psiquiátrica, e a Associação de Amigos, Familiares e Doentes Mentais do Brasil (RJ), que luta pela manutenção do modelo hospitalocêntrico de atendimento. A coleta de dados constou de consulta aos documentos relativos à criação e organização das duas associações e entrevistas semi-estruturadas. Foram realizadas dez entrevistas com familiares que ocupam cargos de direção nas Associações, visto que os mesmos detêm a história oral das mesmas, seus objetivos e organização. Temas fundamentais como a luta pelo reconhecimento da cidadania do doente mental e sua reabilitação psicossocial, a inserção da família no movimento pela reforma psiquiátrica ) e a discussão sobre o modelo assistencial em saúde mental nortearam as discussões. A investigação revelou que, para os familiares da AFDM, a dificuldade na convivência com a doença, a descrença no atendimento prestado pelos novos serviços, a certeza de que o Estado não vem desempenhando o seu papel na assistência à saúde da população são exacerbadas pela possibilidade de fechamento dos hospitais psiquiátricos. Para os familiares da AFB, a sobrecarga do cuidado é amainada pela certeza da parceria com os serviços e profissionais na assistência prestada ao doente mental. As associações representam para os familiares da AFB e da AFDM uma rede de apoio, solidariedade e troca de experiências. Em um país, ainda pobre em recursos assistenciais para a área da saúde mental e sem tradição de assistência sistematizada às famílias nos serviços existentes, é dentro das associações que os familiares encontram a cooperação e o apoio necessários na convivência e assistência à doença mental. A superação dar-se-á a partir da construção e desenvolvimento de um trabalho, realizado pelo Estado, pelos serviços, instituições formadoras e profissionais de saúde, voltado para a realidade social e histórica vivida pelas famílias na assistência prestada ao doente mental.
This study aims at learning the history of family Associations of mental health services, in an attempt to understand what motivates these families to take part in a certain Association; to identify the relative's conceptions about the caring process; to analyze the reasons that lead the family either to care for the mental patient or to delegate the assistance to others, thus contributing for the formulation of directions to guide the assistance to families at mental health services. This study is based on the theoretical-methodological referential of historic materialism as it is suitable for the analysis of social reality from a certain perspective of the world of the involved subjects, considering the historicity of the phenomena and therefore allowing us to (re) look into the organizations of relatives within the family Associations of mental health services. As boundaries for the knowledge of the object, two analytical categories were established: ideology and family. For the building of empirical categories, the discourse analysis technique was used based on what is gathered in the themes found in the discourse of those interviewed. The sceneries used in this study were Associação Franco Basaglia (SP), which favors the proposals of the Psychiatric Reform, and the Associação de Amigos, Familiares e Doentes Mentais do Brasil (Brazilian Associação of Friends, Family and Mental patients) (RJ), which fights for the maintenance of the hospital-centralized model of assistance. The collection of data entailed reference to documents related to the creation and organizations of both associations and semi-structured interviews. There were ten interviews with relatives who were members of the board of the Associations, since they possess the associations´ oral history, their objectives and organization. Fundamental themes such as the fight for the recognition of the mental patients´ citizenship and their psychosocial rehabilitation, the insertion of the family in the movement for psychiatric reform and the discussion of models of mental health assistance steered the discussions. The investigations revealed that, for the family members of AFDM, the difficulty in living near the disease, the disbelief concerning the assistance given by our services, the conviction that the State has not been doing its job in assisting the population´s health are enhanced by the possibility of having the psychiatric hospitals closed. For the families of AFB, the overload of caring is placated by the certainty of partnership with the services and professionals who give assistance to the mental patient. What the associations represent for the AFB and the AFDM families is a net of support, solidarity and exchange of experience. In a country still so poor in resources for the assistance to the mental health area and with no tradition in systematized assistance to families in the existing services, it is within the associations that the families find the cooperation and the support they need to live near and give assistance to mental disease. It may be overcome by the construction and development, by the State, services and institutions that qualify professionals, of a kind of work aiming at the social and historical reality of the families in the assistance given to the mental patient.