A influência da ingestão de bebida alcoólica e transtornos mentais comuns não psicóticos na pressão arterial dos indígenas Mura
The influence of alcoholic beverages consumption and common mental disorder on arterial blood pressure of the Mura Indigenous

Publication year: 2017

Introdução:

A hipertensão arterial é de causa multifatorial, envolvendo hábitos de vida e estilos de vida inadequados como o consumo excessivo de bebida alcoólica que propiciam a elevação dos níveis pressóricos. Além disso, os sintomas relacionados ao transtorno mental comum também podem se associar ao estado de saúde, provocando mais danos ao sujeito com hipertensão arterial. Diante disso, o presente estudo teve como objetivo principal identificar associação entre a ocorrência de hipertensão arterial com o consumo de bebidas alcoólicas e a presença de transtorno mental comum em indígenas das aldeias Muras, residentes em região rural e urbana.

Casuística e Métodos:

Estudo transversal, de base populacional, com 455 indígenas Mura residentes no município de Autazes, Amazonas, Brasil. Foi aplicada a entrevista semi-estruturada com questões referentes aos dados socioeconômicos e educacionais, hábitos de vida, história clínica, histórico familiar, além dos questionários Alcohol Use Disorders Identification Test (AUDIT) e Self-Reporting Questonnaire (SRQ-20), para avaliar o consumo de álcool e presença de transtorno mental, respectivamente. A pressão arterial foi medida com aparelho automático de braço validado. Foram realizadas três medidas e usada a média das duas últimas medidas. Realizaram-se ainda, medida do peso, altura, circunferência do pescoço, circunferência da cintura, avaliação de bioimpedância; glicemia, triglicérides e colesterol com medida capilar. Na análise bivariada, foi testada a associação entre hipertensos, separadamente, com os dois desfechos: consumo de bebidas alcoólicas e a presença de transtorno mental comum explorando especialmente, os aspectos relacionados à hipertensão arterial. Foi ajustada a regressão de Poisson com variância robusta, para ambos os desfechos, com modelagem em stepwise backward automatizado, tendo como critério de entrada, p<0,20 e de significância no modelo final, p0,05. Utilizou-se como estimativa, as razões de prevalência e respectivos intervalos de confiança de 95%.

Resultados:

A maioria dos participantes era do sexo feminino (57,8%), com 42,10 (16,74) anos, vivendo com companheiro (74,7%) e cerca de quatro filhos por família, baixo nível de escolaridade Analfabeto/Fundamental incompleto (41,1%) e renda até dois salários mínimos (85,0%). A prevalência de hipertensão arterial foi de 26,6%, tabagismo (20,4%) e ser sedentário/irregularmente ativo (52,8%). O consumo de bebida alcoólica foi de 40,2%, sendo 13,4% classificados como alto risco para dependência alcoólica, e maior na área rural em comparação à urbana (57,3% vs 22,2%) p<0,001. Destacam-se os seguintes aspectos do uso abusivo de álcool: sentimento de culpa/remorso (45,9%); amnésia repentina por não lembrar o ocorrido na noite em que bebeu (31,7%); além de machucar-se ou sentir-se prejudicado por causa da bebida (29,6%); preocupação por parte de parentes, amigos ou profissionais de saúde, que aconselharam o entrevistado a interromper o consumo (51,5%). Não houve associação entre a presença e consumo de bebida alcoólica (23% e 26%). Os indígenas com diagnóstico de hipertensão referida, faziam menos uso de bebida alcoólica (14,2%vs 85,8%, p=0,009), porém nas ocasiões em que bebiam, ingeriam maior quantidade, comparado com os que não referiram hipertensão [55,3(72,2) vs 33,3(62,2) gramas de Etanol p=0,008]. A prevalência de transtorno mental comum foi de 45,7%, com destaque para os seguintes itens: referência de dores de cabeça frequentes (69,5%), sentir-se nervoso, tenso ou preocupado (66,2%), ter se sentido triste ultimamente (56,0%), dormir mal (55,2%) e ter sensações desagradáveis no estômago (42,9%). Além disso, destaca-se que 7,3% referiram ideia de acabar com a própria vida e 4,2% sentiram-se incapazes de desempenhar papel útil. Após análise ajustada a razão de prevalência após análise ajustada (Razão de prevalência, IC-95%), verificou-se associação positiva entre ingestão de bebida alcoólica e sexo masculino (2,72, IC-2,12-3,48), tabagismo (1,29, IC-1,06-1,56) e morar na zona rural (2,09, IC-1,61-2,72). Porém, a ação foi protetora para idade (0,98, IC-0,98-0,99), consumo de alimentos in natura (0,97, IC-0,95-0,99), e ausência de dislipidemias (0,75, IC-0,62-0,9). Entre os que apresentaram transtorno mental comum, a hipertensão arterial identificada esteve presente em 30,3% e o consumo de álcool uma vez ao mês em 22,1%. Após a análise ajustada (Razão de prevalência, IC-95%) verificou-se associação positiva entre o transtorno mental comum e a zona de moradia urbana (1.25, IC-1,02-1,54), não sabia que tinham antecedentes para diabetes (1.56, IC-1,24-1,96) e a ingestão de bebida alcoólica (1.01, IC-1,00-1,02). Porém, foi ação protetora não ter antecedentes pessoais de cardiopatia (0.59, IC-0,48-0,73).

Conclusão:

Observou-se que a presença de hipertensão arterial, consumo de bebida alcoólica e de transtorno mental comum foram elevados nos indígenas da etnia Mura. Esses achados podem ser decorrentes da aproximação e convivência entre indígenas e não indígenas favorecendo mudanças culturais, especialmente de hábitos e estilos de vida, com aumento do risco de doenças crônicas não transmissíveis.

Background:

The arterial hypertension has a multifactorial disorder, including unappropriated habits and lifestyle as the excessive consumption of alcoholic beverages that may increase the blood pressure. Additionally, the symptoms related to the common mental disorder may be also associated with the health status, producing even more damages to the hypertensive subjects. Thus, this study aimed to identify the association of arterial hypertension occurrence with alcoholic beverages consumption and presence of common mental disorder in Indigenous from Mura villages, who live in rural and urban zones.

Casuistic and Methods:

Its a cross-sectional investigation, with demographic base, conducted with 455 Mura Indigenous from Autazes, Amazon, Brazil. Through a semi-structured interview, we gathered data about sociodemographic and educational profile, lifestyle, clinical records, family antecedents. In this occasion, the Alcohol Use Disorders Identification Test (AUDIT) and the Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) were applied to assess respectively the alcohol consumption and the presence of common mental disorder. The blood pressure was measured with an arm automatic device, validated for this goal, being three measures taken and, from the two last of them, a mean was obtained. Furthermore, we gathered weight, height, neck circumference, waist circumference, bioimpedance, glycemia, triglycerides and cholesterol, capillary measure for the last ones. In the bivariate analysis, we analyzed the association between hypertensive persons and the both outcomes- the alcohol consumption and the presence of common mental disorder, emphasizing the issues hypertension-related issues. The Poison regression, with robust variance, was adjusted for both outcomes, with a modelling in automatized stepwise backward, being p<0,20 the entrance criteria and p<0,05 the significance level for the final model. As estimative, we used the odds ratios and their respective confidence intervals of 95%.

Results:

Most were females (57,8%), with mean age of 42,2(16,74) years, living with a partner (74,7%), with about four children per family, poor educational level- Illiterate/Incomplete Basic (41,1%) and income of up two minimum wages (85,0%). 26,6% of the sample had hypertension, 20,4% were smokers and 52,8% were sedentary/irregularly active. Alcohol consumption was of 40,2%, with 13,4% showed high risk for alcohol addiction, and the consumption was higher in rural area in comparison with the urban one (57,3% vs 22,2%) p<0,001.

We emphasize the following aspects of alcohol abuse:

feeling of guilty and remorse (45,9%); abrupt amnesia for not remembering what happened in the night that they had drunk (31,7%); feeling hurt or impaired due to the drink consumption (29,6%); concerns from relatives, friends or healthcare professionals who advised the interviewed to interrupt the consumption (51,5%). There was not association between presence and alcoholic beverages consumption (23% and 26%). Indigenous diagnosed with referred arterial hypertension drank less alcoholic beverages (14,2%vs 85,8% p=0,009), but, when they drank, they had a larger amount than those with referred hypertension [55,3(72,2) vs 33,3(62,2) grams of Ethanol p=0,008]. The common mental disorder was identified in 45,7% of the individuals, being highlighted the following items: reporting of frequent headaches (69,5%), feeling nervous, anxious or worried (66,2%), feeling sad in the last days (56,0%), sleeping badly (55,2%) and having upset stomach (42,9%). Additionally, 7.3% reported the idea of committing suicide, and 4,2% felt themselves unable to play a useful role. We verified positive association between alcoholic beverage consumption and male gender (2.72, CI-2,12-3,48); smoking (1.29, CI-1.06-1.56); and living in rural area (2.09, CI-1.61-2.72). However, the action was protective for the age (0.98, CI-0,98-0,99), intake of natural foods (0.97, CI-0,95-0,99), and absence of dyslipidemias (0.75, CI-0,62-0,9). Among those diagnosed with common mental disorder, the arterial hypertension was found in 30,3% and the alcohol consumption once a month in 22,1%.

We observed a positive association of common mental disorder and:

living in the urban area (1.25, CI-1,02-1,54); unknowing the antecedents for diabetes (1.56, CI-1,24-1,96); and the alcohol consumption (1.01,CI-1,00-1,02). However, the absence of personal background of heart diseases was not protective (0.59, CI-0,48-0,73).

Conclusion:

We observed that the presence of arterial hypertension, alcoholic beverages consumption and common mental disorder were high in the Mura ethnicity. This finding may be explained for the approach and interaction among Indigenous and non-Indigenous, which favors cultural changes, especially in habits and lifestyle, increasing the risk of non-transferable chronic diseases.