Infecções relacionadas à assistência à saúde e internações por condições sensíveis à atenção primária: há alguma associação?
Healthcare-Associated Infection and Primary Care Sensitive Conditions: is there an association?

Publication year: 2019

Introdução:

As Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde se tornaram um grave problema mundial de saúde pública e de segurança do paciente, em cuja prevenção a enfermagem tem enorme contribuição. Nos sistemas de saúde, a Atenção Primária à Saúde é considerada um elemento chave, sendo responsável pelo seguimento longitudinal dos indivíduos e suas famílias. Um dos indicadores utilizados para avaliar a eficácia da Atenção Primária à Saúde é composto por uma lista de condições denominadas Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária. A hipótese principal desse estudo é que pacientes cujo motivo da hospitalização foram Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária podem ser mais vulneráveis à aquisição de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde. No entanto, não encontramos estudos anteriores que investigaram a associação de Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária com a aquisição de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde.

Objetivo:

Identificar se existe associação entre Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária e aquisição de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde.

Método:

Trata-se de um estudo epidemiológico de coorte, conduzido em hospital público de atendimento terciário do Estado de São Paulo. A amostra incluiu 605 pacientes adultos recrutados após 48 horas de internação e acompanhados até o aparecimento das Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde ou por um período máximo de 30 dias. Os casos de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde foram identificados pela equipe hospitalar da Comissão de Controle de Infecção de acordo com seu processo de rotina, utilizando critérios padronizados. Utilizou-se questionário estruturado para caracterizar o perfil demográfico, socioeconômico e de saúde dos participantes. As variáveis relevantes de morbidade e de Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária foram coletadas do prontuário médico eletrônico médico do participante; a ocorrência de Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária foi definida de acordo com a lista nacional brasileira. Os dados foram apresentados com análise descritiva e univariada com nível de significância p < 0,05.

Foram utilizados três modelos de análise estatística para avaliar o desfecho diante de variáveis socioeconômicas e clínicas selecionadas:

1) Modelo de regressão logístico; 2) Modelo de regressão multinível e 3) Estudo de caso-controle aninhado, utilizando o escore de propensão para pareamento dos casos. Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo e do Hospital das Clínicas.

Resultados:

Dos 605 participantes identificamos 4,5% episódios de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde; 8,3% pacientes com Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária e 0,8% com pacientes Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária e que adquiriram Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde. Houve predomínio do sexo masculino e de brancos entre os grupos com Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde e com Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária; a idade média variou de 52,3 a 58,5 anos. A média dos anos de estudos entre os grupos variaram entre 7,5 anos a 8,8 anos. A renda familiar média mensal no grupo com Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária e Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde foi a menor (R$ 1.308,60). Houve predomínio da população do município de São Paulo, que apresenta Índice de Desenvolvimento Humano Municipal de 0,805 e Índice de Gini de 0,62. A infecção do sítio cirúrgico foi a mais frequente (21,8%, n=7). As Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primárias mais frequentes foram as doenças cerebrovasculares (31%) e diabetes mellitus (18%). Os modelos logísticos (regressão e multinível) revelaram associação entre as Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde e as Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária (respectivamente odds ratio de 2,960, IC95%: 0,9998,773; odds ratio de 2,877, IC95%: 0,960-8,262).

Conclusão:

Os resultados demonstraram uma associação entre as Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde e Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária. As variáveis socioeconômicas não apresentaram associação com a ocorrência de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde e Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária. Ainda, não foi possível observar no desenho deste estudo se os determinantes socioeconômicos podem influenciar negativamente no processo de saúde com relação às Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde. Assim, fazem-se necessários mais estudos com outras abordagens metodológicas, como estudos multicêntricos e estudos mistos, para que seja possível explorar melhor o contexto socioeconômico e sua relação com o aparecimento das Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde.

Background:

Healthcare-associated infections (HAI) are a major public health problem in which nursing has an enormous contribution. In health systems, the Primary Health Care (PHC) is considered a key element being responsible for the longitudinal segment of individuals and their families. The indicator used to assess the effectiveness of PHC consists a list of conditions called Primary Care Sensitive Conditions (PCSC). The main hypothesis of this study is that patients whose reason for hospitalization was an ICSAP may be more vulnerable to the acquisition of HAI. However, we did not find studies that have investigated the association of PCSC with HAI acquisition.

Aim:

The aim of this study is to identify whether there is an association between PCSC and HAI.

Methods:

This is an epidemiological prospective cohort study conducted in the public care service of the state of São Paulo. The sample included 605 adult patients recruited after 48 hours of hospitalization and followed up until the onset of HAI or for a maximum period of 30 days. The infection control team according to their routine process identified cases of HAI, by using standardized criteria. We used a structured questionnaire to characterize the demographic, socioeconomic and health profile of participants. The relevant variables of morbidity and PCSC were collected from the medical electronic medical record of the participant; the occurrence of PCSC was defined according to the Brazilian national list. Data were presented with descriptive and univariate analysis with significance level p <0.05. Three models of statistical analysis were used to evaluate the development of the outcome and selected variables (socioeconomic and clinical): 1) Logistic regression model; 2) Multilevel regression model; 3) The case-control study, using the propensity score for case matching. This project was approved by the Ethics Committee of the Nursing School of USP and by the Ethics Committee of Hospital das Clínicas.

Results:

Out of 605 study participants, we identified 4.5% episodes of HAI, 8.3% with PCSC and 0.8% with PCSC and HAI. There was a predominance of males and whites among the groups with healthcare-related infections and hospitalizations for conditions sensitive to primary care; The average age ranged from 52.3 to 58.5 years. The average years of study between groups ranged from 7.5 years to 8.8 years. The average monthly family income in the group with PCSC and HAI was the lowest (R$ 1,308.60). There was a predominance of Sao Paulo city residents; this city presents the Municipal Human Development Index of 0.805 and Gini Index of 0.62. Surgical site infection was the most frequent ( 21.8%, n=7). The most frequent PCSC were cerebrovascular diseases (31%) and diabetes mellitus (18%). Logistic models (regression and multilevel) showed an association between HAI and PCSC (respectively odds ratio of 2.960, 95% CI: 0.999 8.773; odds ratio of 2.877, 95% CI: 0.960 - 8.262).

Conclusion:

The results demonstrated an association between HAI and PCSC. The socioeconomic variables were not associated with the acquisition of HAI and PCSC hospitalizations. Still, it was not possible to observe this phenomenon in the design of this study if the socioeconomic determinants can negatively influence the health process in relation to HAI. Thus, further studies with other methodological approaches, such as multicenter studies and mixed studies, are necessary to better explore the socioeconomic context of patients and its relationship with the emergence of HAI.