Segurança do paciente no contexto hospitalar: estudo sobre incidência e evitabilidade de eventos adversos em hospital de grande porte
Patient safety in hospital context: study of incidence and preventability of adverse events in a large hospital
Publication year: 2019
Eventos adversos (EA) são definidos como lesão ou dano não intencional que resulta em incapacidade ou disfunção, temporária ou permanente, e/ou prolongamento do tempo de permanência hospitalar ou morte em decorrência do cuidado em saúde prestado, não havendo vínculo com o processo de doença subjacente do paciente. A taxa de EA no ambiente hospitalar constitui um relevante indicador para a segurança do paciente, tendo em vista que a combinação complexa de processos, tecnologias e interações humanas, que integram o sistema de saúde, acarreta benefícios importantes, mas, ao mesmo tempo, conduz ao risco de ocorrência de EA. Nesse cenário, este estudo objetivou analisar a incidência e a evitabilidade de EA relacionados ao cuidado em saúde em pacientes adultos internados em um hospital geral de grande porte. Trata-se de estudo de coorte retrospectiva, no qual a análise dos EA foi baseada na revisão retrospectiva de prontuários em duas etapas. A população-alvo do estudo foi constituída por pacientes adultos internados no hospital pesquisado, no período compreendido entre janeiro e dezembro de 2015, com alta/óbito no mesmo ano, e as características: idade igual ou superior a 18 anos; internação com mais de 24 horas de permanência hospitalar ou óbito em menos de 24 horas; admissão nas diversas unidades e/ou especialidades médicas na ocasião da internação objeto de avaliação, exceto psiquiatria e obstetrícia. Foram excluídos os pacientes com prontuários indisponíveis na íntegra no momento da coleta de dados e/ou em seguimento pela equipe de cuidados paliativos com registro no prontuário. Para conduzir a revisão retrospectiva dos prontuários, utilizou-se a versão informatizada dos formulários de rastreamento (primeira fase) e de avaliação de EA (segunda fase). Na fase de rastreamento, profissionais de saúde executaram uma avaliação explícita dos prontuários com a finalidade de rastrear potenciais eventos adversos (pEA), bem como delinear o perfil demográfico, clínico e relativo à internação dos pacientes. A constatação da presença de ao menos um critério de rastreamento nessa fase, denotou a elegibilidade do prontuário para a segunda etapa da revisão. Na fase de avaliação, profissionais médicos realizaram uma avaliação implícita e estruturada dos prontuários para identificação dos EA previamente rastreados, averiguando alguns atributos de interesse: incidência, evitabilidade, gravidade, classificação segundo a natureza, tempo de permanência hospitalar atribuível ao EA, tipo de erro e seus fatores causais. Dentre os 368 pacientes que integraram a amostra final, 166 apresentaram pEA, prosseguindo para a etapa seguinte. Na segunda fase, constatou-se que 149 pacientes sofreram algum tipo de incidente (com ou sem dano). Ao final, foram confirmados 266 EA relacionados ao cuidado em saúde prestado, os quais acometeram 124 pacientes. Assim, a incidência de EA relacionados ao cuidado em saúde prestado correspondeu à 33,7%. O tempo de permanência hospitalar foi identificado como fator de risco para ocorrência de EA, uma vez que o tempo de permanência de oito dias ou mais aumentou o risco de ocorrência de EA em 1,2 vezes em relação às internações com menos de oito dias de permanência (RR: 1,20; IC 95%: 1,04 - 1,39).
Os EA foram classificados como:
relacionados ao cuidado em geral (22,6%); relacionados ao medicamento (18,8%); relacionados à infecção hospitalar (13,2%); relacionados ao procedimento (40,6%); relacionados ao diagnóstico (0,8%); e outros tipos de EA (4,1%). Quanto à gravidade dos EA, averiguou-se que 63,2% foram considerados leves, 20,7% moderados e 16,2% graves. Em referência à evitabilidade dos EA, estimou-se que 58,3% foram evitáveis. O erro humano foi responsável pela maioria das ocorrências e os erros por omissão prevaleceram, quando comparados aos erros por comissão. Acerca dos fatores contribuintes para a ocorrência dos EA, o cuidado prestado constituiu o principal fator causal. Este estudo possibilitou uma visão geral dos tipos de problemas que permeiam a segurança do paciente, norteando possíveis intervenções futuras para a atenuação de EA específicos e, imediatamente, favorecendo a promoção de uma cultura de segurança nas instituições de saúde. O conhecimento sobre a incidência, natureza, gravidade e evitabilidade dos EA que ocorrem no ambiente hospitalar deve ser assimilado como um primeiro passo em direção ao aprimoramento da segurança do paciente e da qualidade na assistência à saúde
Adverse events (AE) are defined as unintended injury or harm resulting in temporary or permanent disability or dysfunction, and/or prolonged hospital stay or death caused by health care provided, and there is no connection with the process of the patient's underlying disease. The rate of AE in the hospital setting is a relevant indicator for patient safety, as the complex combination of human processes, technologies, and interactions that integrate the healthcare system has important benefits, but at the same time leads to the risk of AE occurrence. In this scenario, this study aimed to analyze the incidence and preventability of AE related to health care in adult patients admitted to a large general hospital. This is a retrospective cohort study, in which the analysis of AE was based on a two-stage retrospective review of the medical records. The study target population consisted of adult patients admitted to the investigated hospital, from January to December 2015, with discharge/death in the same year, and the characteristics: aged at least 18 years; hospitalization with more than 24 hours of hospital stay or death in less than 24 hours; admission to the several units and/or medical specialties at the time of hospitalization, except psychiatry and obstetrics. Patients with unavailable medical records at the time of data collection and/or follow-up by the palliative care team registered in the medical record were excluded. To conduct a retrospective review of the medical records, a computerized version of the screening (first stage) and EA evaluation (second stage) forms were used. In the screening stage, health professionals performed an explicit assessment of medical records in order to track potential adverse events (pAE) as well as delineate the demographic, clinical and hospitalization profile of patients. The presence of at least one screening criterion (trigger) in this phase indicated the eligibility of the medical records for the second stage of the review. During the evaluation phase, physicians performed an implicit and structured assessment of the medical records to identify previously screened AE, checking some attributes of interest: incidence, preventability, severity, classification according to nature, length of hospital stay attributable to AE, type of error and causal factors. Of the 368 patients in the final sample, 166 had pAE, proceeding to the next stage. In the second stage, it was found that 149 patients suffered some type of incident (with or without harm). At the end, 266 AE related to health care were confirmed, which affected 124 patients. Thus, the incidence of AE related to health care provided corresponded to 33.7%. Length of hospital stay was identified as a risk factor for the occurrence of AE, since length of stay of eight days or more increased the risk of occurrence of AE by 1.2 times compared to hospitalizations with less than eight days (RR: 1.20; 95% CI: 1.04 - 1.39).