Sobre o final da vida: experiência de estudantes de enfermagem
Publication year: 2017
A Enfermagem como profissão se ocupa com o alívio do sofrimento, com a minimização da dor, com a dignidade diante da morte, com aspectos envolvidos com a condição humana, com o percurso da vida, com o cuidado do outro e de si. Falar sobre o final da vida, sobre como lidar com o luto são permanentes temáticas na mídia, nas redes sociais, nos grupos de conversas, o que o torna tema para a problematização de pesquisas. As tentativas de minimizar as angústias, as frustrações e os medos dos profissionais e estudantes que cuidam de pessoas que estão morrendo são inúmeras, assim, fui instigada a repensar minha maneira de ensinar e meus modos de agir em relação a pessoas que estão no final da vida. Neste contexto, considerando as vivências dos alunos durante a formação em Enfermagem, organizei a seguinte questão de pesquisa: como é iniciar as práticas hospitalares cuidando de pacientes no final da vida? Deste modo, tracei como objetivo conhecer as vivências de estudantes de graduação em enfermagem que iniciaram suas práticas hospitalares cuidando de pacientes no final da vida. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, descritiva, que utilizou a técnica de grupo focal para produção de dados. Participaram do grupo estudantes do Curso de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que vivenciaram a primeira prática hospitalar no Núcleo de Cuidados Paliativos do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Para análise dos dados foi utilizada a análise do discurso proposta por Michel Foucault que explicita a íntima relação entre discurso e poder. Os discursos foram organizados de modo a destacar o domínio, a descrição dos acontecimentos, a língua e o acontecimento discursivo. A partir deste percurso, procurei signos que designam coisas e essas coisas é que foram descritas.
Da análise das falas emergiu a categoria Aprendendo a ser trabalhador que é apresentada com dois marcadores discursivos denominados:
Mesmo estando ali, parece que eu não faço nada e Caiu a ficha, que caracterizam o processo vivenciado pelos estudantes. A partir das falas dos estudantes e com a contribuição teórica de Jorge Larrosa (1994) foi possível modificar a palavra vivência, presente na pergunta e objetivo da pesquisa, por experiência. Assim, refletiu-se sobre experiência, experiência de si, tecnologias do eu entre outros conceitos sustentadores para procurar entender o processo de aprender a ser trabalhador. Os estudantes têm a impressão de que não fazem nada, considerando que historicamente a enfermagem empreende ações para “salvar vidas” e não para ajudar a morrer. É possível pensar que a morte do paciente desencadeia uma ausência de autoconfiança, uma debilidade, vergonha, culpa, e até abala a identidade com a profissão. Depois, cai a ficha, quando percebem que podem fazer muito pelos pacientes, seja um banho, uma troca de bolsa de colostomia, um conforto. Tais experiências representam o processo de ser trabalhador, que passa por domínios de saber, tipos de normatividade e subjetivação. Ao problematizar como estudantes experenciam o cuidado de enfermagem diante do final da vida pretendi demonstrar que mesmo que alunos e alunas tenham conhecimento sobre o final da vida, sobre o corpo, cada morte de paciente será evento novo, diferente do outro, pois cada pessoa, cada circunstância tem singularidades que necessitam ser consideradas. Cabe aos profissionais, estudantes e professores/as (re)conhecerem que a experiência é evento único, que se desenvolve a partir de determinadas tecnologias do eu.
Nursing, as a profession, is concerned about the relief of suffering, the minimization of pain, the dignity before death, about aspects related to the human condition, way of life and taking care of each other and of themselves. Talking about the end of life and dealing with mourning are permanent themes in the media, social networks, groups of conversations among other social forums, which makes this subject relevant to a research issue. Attempts to minimize the anxieties, frustrations and fears of professionals and students taking care of people who are dying are numerous. Since life is permeated by discourses and knowledge, I was instigated to rethink the way I teach, as well as the way I face what causes discomfort for the students, regarding this issue. On the context of the end of life and the experiences of the students through education in nursing, I performed the following research question: How to start hospital practices taking care of patients at the end of their lives? Thereby, traced as an objective to know the experiences of undergraduate nursing students who started their hospital practices caring for patients at the end of their lives. The present research is qualitative and descriptive and, through the focus group technique, analyzed discourses of students of the Nursing Course who experienced the first hospital practice in the Center of Palliative Care of the Hospital of Clinics of Porto Alegre (HCPA). As a result from the analysis emerged the category named as “Learning to be a worker”, presented with two markers denominated: “even being there, it seems that I do not do anything” and “I realized” that characterize the process experienced by the students. From these markers, it was possible to reflect on the experience, self-experience, technologies, among other supportive concepts for the possibility of understanding the process of learning how to be a worker. Students have the impression that they do nothing, considering that historically nursing undertakes actions to "save lives" and not to help to die. It is possible to think that death triggers an absence of self-confidence, weakness, shame, guilt, and even loss of identity with the profession. To discuss how students experience nursing care facing the end of life was not to confirm what is already said and written about the lack of preparation of the students. The aim was to demonstrate that independent of the knowledge about the end of life, each event of death will be different from the other, each person; each circumstance has singularity, individuality, both of himself and of the other. It is up to the professionals, students and teachers to know that the experience is a single event, that develops the self-technologies, that makes possible the theory of practice, allows the reflection on the technicality on the fragmentation of the care. Thus, caring will not be purely prescriptive, automatic/mechanical, aiming at the object, it will enable the subjectivity of human conditions and the uniqueness of oneself and the other.