Não vou esquecer nunca!: a experiência feminina com o abortamento provocado

Publication year: 1999

Estudo de caso qualitativo, em que se objetivou verificar quais os significados atribuídos ao abortamento provocado por mulheres que adotaram essa conduta e analisar o impacto dessa experiência sobre o autoconceito das mulheres, tendo por base a abordagem teórico-metodológica do Interacionismo Simbólico. O estudo foi realizado na Unidade de Obstetrícia de um hospital público localizado no município de João Pessoa-PB, tendo como população as mulheres admitidas naquela instituição com o diagnóstico de "abortamento incompleto" e submetidas a curetagem uterina no período compreendido entre novembro de 1997 e março de 1998. Para a constituição da amostra, foram estabelecidos como critérios de seleção: ter idade entre 15 e 45 anos, intervalo considerado como o de idade fértil da mulher; admitir, por sua livre vontade, haver provocado o abortamento; e dar o consentimento livre e esclarecido para participar do estudo. Ao final da etapa de coleta de dados, a amostra do estudo ficou constituída por um grupo de nove mulheres. A técnica empregada para a coleta de dados foi a da gravação de entrevista semi-estruturada, durante a qual foi utilizado um roteiro que contlemplava algumas questões norteadoras, elaboradas com a finalidade de favorecer o alcance dos objetivos estabelecidos para o estudo. Os dados obtidos foram submetidos a categorização tendo como eixo orientador as questões incluídas no roteiro de entrevista, a saber, as circunstâncias antecedentes da gravidez; as reações das mulheres e de seus parceiros sexuais diante da suposição/ confirmação da gravidez indesejada; os aspectos envolvidos na tomada de decisão acerca do abortamento; as ações e reações da mulher durante o ato do abortamento; e as percepções das mulheres sobre o significado e sobre as conseqüencias pessoais do abortamento provocado. Entre os resultados obtidos, ressalta-se a ambigüidade e a contradição de seus discursos ao avaliar a experiência, e as reações psicológicas negativas que haviam desenvolvido, entre as quais foram relatados o remorso/consciência pesada, o arrependimento, a sensação de perda e, principalmente, a culpa que segundo seus relatos, carregariam para o resto de suas vidas. Tais resultados evidenciam que o abortamento provocado representa uma solução precária e discriminatória para a mulher que resolve recusar deliberada e voluntariamente a continuidade de uma gravidez indesejada, com reflexos identificáveis em seu autoconceito