O trabalho das enfermeiras em prestadores privados de serviços de saúde
Publication year: 2018
O sistema de saúde brasileiro é composto por uma combinação público-privada, no qual a força de trabalho da enfermagem se insere. No capitalismo neoliberal, as condições do trabalho em saúde são marcadas por acentuadas divisões, ritmos impostos, hierarquização e sistemas de controle que podem levar a sofrimentos que impactam a saúde do trabalhador e a qualidade do cuidado. Diante do exposto, delimitou-se como objeto deste estudo o trabalho das enfermeiras no setor privado de saúde, com os seguintes objetivos: analisar as condições de trabalho das enfermeiras na saúde privada e discutir quais os sofrimentos e defesas dessas profissionais nesse setor. Trata-se de um estudo de natureza descritiva e exploratória, com onze enfermeiras participantes que, à época da coleta de dados, atuavam em unidades de serviço privado há pelo um ano. As participantes foram identificadas pela técnica da snowball. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista semiestruturada, orientada por um roteiro previamente construído. A análise dos dados seguiu a técnica da análise de conteúdo e se apoiou no referencial teórico de Christopher Dejours. Após a transcrição das entrevistas, identificaram-se as unidades de registro, que foram agrupadas em núcleos de sentido; esses, por sua vez, reuniram-se em subcategorias que compuseram as duas categorias de análise referentes aos objetivos do estudo: a) condições do trabalho das enfermeiras no setor privado; b) o sofrimento e as defesas das enfermeiras no cotidiano do trabalho. Os resultados apontam que todas as enfermeiras foram contratadas com vínculos celetistas, o que lhes conferem proteção social. No entanto, foram encontradas condições precárias de trabalho, determinadas pelos requerimentos de desempenho superior, normalização de condições extremas, condições inadequadas de trabalho, burocracia imposta. Ainda em relação às condições de trabalho, evidenciou-se a banalização do mal, expressa na mentira instituída e na violência social. Os sofrimentos decorrentes das condições de trabalho e mencionados pelas participantes são os que estão relacionados com o trabalho fatigante, a falta de reconhecimento e o medo. Conclui-se que existem condições precárias no trabalho da enfermeira do setor privado de saúde porque lhes é requerido produtividade extrema, além de existir submissão às situações de violência social banalizadas. Falta-lhes tempo, e o trabalho se dá sob intensa burocracia, na qual não há espaço para o trabalho criativo. Como defesa ao sofrimento imposto, as participantes recorrem à resignação e a um consequente isolamento, em que as enfermeiras sofrem em si mesmas, o que imobiliza a categoria e as levam à alienação. Através do reconhecimento do paciente, conseguem descarga psíquica positiva, o que as fortalece contra o adoecimento.
The Brazilian health system is composed of a combination of public and private systems, in which the nursing workforce is inserted. In a neoliberal capitalist society, health labour conditions are marked by sharp divisions, imposed rhythms, hierarchisation and control systems, all of which may lead to hardships that affect both the worker's health and the quality of care. Given this scenario, this study aims to address the working conditions of nurses in the private health sector and discuss the worker's tribulations and defenses. It is a study of both descriptive and exploratory nature, involving eleven nurses who, at the time of data collection, had been working in the private sector for at least one year. The subjects were selected using the snowball method of searching. The data collection was carried out through semi-structured interviews, oriented by a previously devised script. The data analysis adopted the content analysis technique and was based on the theoretical references of Christopher Dejours. Following the interviews' transcriptions, the registry units were first identified and, then, grouped by ideas; these, in turn, were grouped into subcategories which composed the two categories of analysis related to this study's objectives: a) the working conditions of nurses in the private sector; b) the tribulations and defenses experienced by nurses in their daily working routine. The results indicate that all the nurses were hired under CLT contracts, which granted them social protection. However, precarious working conditions were found - produced by high performance demands, the normalization of extreme conditions, inadequate working conditions, and imposed bureaucracy. Furthermore, the trivialization of evil became apparent, evidenced by the ruling practice of lying and the social violence. The resulting ordeals mentioned by the subjects are related to exhausting work, lack of recognition and fear. In conclusion, nurses face precarious working conditions in the private sector due to the demands of extreme productivity, as well as to their submission to situations of trivialized social violence. They lack time, and their work is done under heavy bureaucracy, under which there are no grounds for creativity. As a defense mechanism to the suffering imposed on them, the subjects resort to resignation and isolation, under which the nurses suffer alone, immobilizing and alienating the category. The recognition they get from patients gives them a positive psychic discharge, which strengthens them against illness.